Acusado de mandar incendiar casa de novo presidente do União Brasil, Bivar dirigiu o Sport, falou ter pago propina para colocar atleta na Seleção, defendeu aborto e corte de militares

Pivô da guerra no União Brasil, acusado até de mandar incendiar a casa do novo presidente da sigla

, o deputado federal Luciano Bivar, de 79 anos, acumula polêmicas, embates e denúncias de irregularidades muito antes de ser conhecido no universo da política nacional. Além de parlamentar, Bivar é empresário do setor de seguros e cartola de futebol, com direito a admissão de suborno a integrantes da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Foi no mundo do futebol que Bivar fez fama em seu Estado, Pernambuco, onde, aos 18 anos, já era diretor de tênis do Sport Club do Recife, modalidade que praticava quando jovem. Seu pai havia sido presidente do tradicional time de futebol da capital pernambucana em 1952. Um de seus irmãos também ocupou a posição.

Luciano Bivar foi mais longe. Tornou-se diretor de futebol do Sport em 1984 e, em 1987, quando era vice-presidente, o clube conquistou o Campeonato Brasileiro (único da história do time pernambucano, que ainda hoje é reivindicado pelo Flamengo, por causa da confusa fórmula da competição). Após a vice-presidência, Bivar foi eleito presidente do Sport para o biênio 1989-1990.

Ele voltaria a comandar o clube em outros cinco mandatos (1997/1998, 1999/2000, 2001, 2005/2006 e 2013/2014).  E, na última gestão, Bivar admitiu em entrevista que pagou lobistas para interceder junto à CBF para que o volante Leomar, jogador do Sport, fosse convocado pela Seleção Brasileira em 2001.

Na época, a convocação de Leomar foi muito questionada pela imprensa e pelo público. O volante chegou a ser capitão da Seleção e disputou a Copa das Confederações de 2001. O então técnico do time canarinho era Émerson Leão e o presidente da CBF, Ricardo Teixeira.

“Nós contratamos lobistas para colocar o Leomar na Seleção Brasileira. Isso é feito hoje, como era feito antigamente. Se eu pudesse colocar cinco jogadores do Sport na Seleção Brasileira hoje, eu colocaria”, afirmou Bivar à uma rádio do Recife. Perguntado sobre a identidade dos lobistas, ele riu e sugeriu que os jornalistas apurassem a história, pois ele não a revelaria.

O então procurador-geral do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), Paulo Schmitt, pediu abertura de inquérito contra Bivar. Mas ninguém foi punido por nada. Sequer foram revelados os nomes dos tais lobistas. Já Romário, ex-jogador da Seleção e hoje senador pelo PL, elogiou a “coragem” de Bivar.

Em dezembro de 2022, Bivar tentou reassumir o comando do Sport, numa eleição que envolveu embates judiciais. Mas ele acabou derrotado por Yuri Romão, que foi reeleito com 1.463 votos (96,50%) dos sócios. Bivar teve 53 (3,50%) votos. Dez torcedores votaram nulo.

Integrante da Bancada da Bola e liberal

Ao mesmo tempo que comandava com mão de ferro o Sport, Luciano Bivar se cacifava na política nacional. Ele foi eleito deputado federal por Pernambuco pela primeira vez em 1998 pelo Partido Social Liberal (PSL), o único do partido que presidiu ininterruptamente por 20 anos, entre 1998 e 2018.

Em seu primeiro mandato, integrou a chamada Bancada da Bola, formada por cartolas, e a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou os contratos da CBF com a Nike, mas que terminou sem avanço no campo jurídico, com forte lobby da entidade máxima do futebol, sob comando de Ricardo Teixeira.

Em 2006, Bivar se lançou candidato à Presidência da República pelo seu PSL. Ele se declarava liberal. Sua principal bandeira era a instituição de um imposto único federal. Propôs ainda a instalação de “mini quartéis” nas favelas. Ficou em último lugar, com 62.064 votos (0,06% do total).

Bivar voltou a se candidatar a deputado federal em 2014. Ficou na suplência. Assumiu uma cadeira em julho de 2017, graças à nomeação de Kaio Maniçoba (PMDB) como secretário de Habitação de Pernambuco. Permaneceu no cargo até abril de 2018. Voltou a ser eleito deputado federal em 2018 e reeleito em 2022.

Defensor do aborto e do corte de despesas militares

Luciano Bivar também se apresenta como escritor. O político é também escritor. Publicou livros de ficção e não ficção, como “Brasil alerta: psicoses socialistas” (1985), “Cuba: num retrato sem retoques” (1986), “Passagem para a vida: operação terror” (1989), “Burotocracia: a invasão invisível” (2006), “Intuição: a terceira mente” (2016) e “50 formas de amar. Uma é matar: Um livro picante, avassalador, surpreendente e extremamente sentimental” (2019).

Em “Burocratocia: A Invasão Invisível”, Bivar defende o aborto e o corte no gasto militar. Em sua campanha para presidente da República, em 2006, ele pediu um plebiscito sobre a união de pessoas do mesmo sexo e defendeu o Bolsa Família.

“Combati a retórica e a falácia dos defensores dos direitos humanos, quando propus a legalização do aborto e da eutanásia e a introdução da pena de morte para crimes de sequestro seguido de morte”, escreveu Bivar em “Burocratocia: A Invasão Invisível”.

Ele também defendeu tratados para que grandes potências participassem da defesa do Brasil, com corte nos gastos com as Forças Armadas do Brasil: “Com isso, podemos diminuir 60% do nosso recrutamento militar, poupando uma verba anual expressiva”.

Aliança com Bolsonaro, “laranjal” e racha 

O nanico PSL de Bivar viria a se tornar um gigante em 2018, quando o então deputado federal Jair Bolsonaro se filiou para sua candidatura à Presidência. Candidato que tinha bandeiras completamente contrárias às então defendidas pelo comandante da sigla.

Além de eleger o chefe do executivo nacional, o PSL fez a segunda maior bancada da Câmara dos Deputados, com 52 parlamentares, atrás apenas do PT.

Para acomodar Bolsonaro e aliados, Bivar cedeu temporariamente a presidência do PSL ao advogado Gustavo Bebianno, que coordenou a vitoriosa campanha presidencial. Depois da eleição, Bivar voltou ao comando do partido.

Já Bebianno foi nomeado ministro da Secretaria-Geral da Presidência, mas durou menos de dois meses no cargo. Saiu após brigar com um dos filhos do presidente, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), e em meio ao escândalo conhecido como “Laranjal do PSL”, com candidaturas laranjas de mulheres em 2018.

As candidaturas femininas deveriam preencher a cota de 30% de candidatas mulheres exigida por lei. O caso teve como pivô o ex-ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, que havia comandado o PSL de Minas Gerais nas eleições de 2018. Bivar foi alvo das investigações do “Laranjal do PSL”. Teve a casa vasculhada por policiais federais em outubro de 2019.

Bivar sempre negou as acusações e passou a criticar publicamente a cota de gênero nos partidos.  “[A política] não é muito da mulher. Eu não sou psicólogo, não. Mas eu sei isso”, disse, em entrevista à Folha de S. Paulo.

Enquanto isso, Bebianno, que se tornou adversário de Jair Bolsonaro e filhos, morreu em março de 2020, de infarto fulminante. À época, era cotado para disputar a Prefeitura do Rio de Janeiro pelo PSDB.

A lua de mel do PSL com o bolsonarismo também foi breve. Com Bivar brigando para manter o controle do partido e seu milionário fundo, Bolsonaro deixou a sigla em novembro de 2019, depois de dizer a um apoiador no cercadinho do Palácio da Alvorada para “esquecer o PSL” e que Bivar estava “queimado para caramba”.

Com a posição de Bolsonaro, deputados do PSL viraram adversários, divididos entre os fiéis à legenda e os “bolsonaristas raízes”. Nesse cenário, Bolsonaro tentou fundar um partido, o Aliança pelo Brasil. Apesar de eventos públicos e da intensa campanha pelas redes sociais, a iniciativa não vingou. O presidente se filiou ao PL de Valdemar Costa Neto, condenado e preso por envolvimento no “Mensalão”, que atingiu em cheio o PT, maior adversário de Bolsonaro.

Assim como o então presidente da República, seus principais seguidores no PSL migraram para o PL ou outras legendas da base governista. Na eleição de 2022, a bancada do PL saltou de 33 para 78 e tornou-se a maior legenda da Câmara.

De pré-candidato a presidente a ameaçado de expulsão

Para ganhar musculatura, o PSL se fundiu com o DEM e formou o União Brasil. Em 14 de abril de 2022, o partido aprovou o nome de Bivar como pré-candidato da sigla para as eleições presidenciais, como proposta de “terceira via”, diante da polarização entre Lula e Bolsonaro. Mas, em 31 de julho, Bivar anunciou a desistência da candidatura em uma convenção do partido.

O partido hoje tem a terceira maior bancada da Câmara, com 59 integrantes, além de 7 senadores e 4 governadores. Além disso, possui três ministros do governo Lula: Juscelino Filho (Comunicações), Celso Sabino (Turismo) e Waldez Goes (Integração e Desenvolvimento Regional).

O União Brasil dispõe de R$ 517 milhões de fundo eleitoral para a campanha deste ano. E, segundo personagens do mundo político, este é o principal motivo para a guerra declarada entre Luciano Bivar e antigos aliados, que elegeram Antonio de Rueda novo presidente do partido.

Na terça-feira (13), a bancada do União Brasil se reuniu para, entre outras coisas, tratar da iminente expulsão de Bivar – ele é o presidente da sigla até 31 de maio. O estopim para a medida é a acusação de ameaça a Rueda e o incêndio às casas de veraneio dele e da irmã, Maria Emília de Rueda, que é tesoureira do partido, na noite de segunda-feira (11). Os imóveis ficam na praia de Toquinho, perto de Porto de Galinhas, no litoral sul de Pernambuco.

Os caciques do União Brasil tratam os incêndios como crime político e apontam Bivar como principal suspeito. Advogado dos Ruedas afirmou na terça-feira que pedirá ao Supremo Tribunal Federal (STF) a investigação de Bivar.

O governador de Goiás, Ronaldo Caiado, um dos principais nomes da sigla, foi mais longe. Ele afirmou, em entrevista, que os incêndios envolvem crimes de “pistolagem” e que Luciano Bivar é o responsável. Disse ainda que o partido acionará o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o Conselho de Ética com o intuito de tirar o mandato de Bivar.

Rueda registrou ocorrência de ameaça e acusou Bivar

Antônio de Rueda registrou, na véspera do encontro que o consagrou presidente do União Brasil, ocorrência de ameaças de morte contra ele e familiares. Rueda acusou Bivar de ser o autor. O ex-presidente do partido também tem uma casa na praia de Toquinho.

As ameaças, segundo Rueda, tinham como motivação justamente a disputa pelo comando do União Brasil. Rueda foi eleito presidente da sigla em 29 de fevereiro. Bivar tentou impedir a convenção, mas seus adversários aprovaram um recurso para garantir o encontro que resultaria na vitória de Rueda. Bivar foi à reunião e chamou Rueda de “covarde”.

Um dia antes, Rueda fez representação criminal contra Bivar na Delegacia Especial de Crimes Cibernéticos da Polícia Civil do Distrito Federal. Devido ao foro privilegiado de Bivar, a polícia pediu ao STF autorização para abertura de investigação contra ele. O caso tramita em segredo de Justiça.

Rueda apresentou como principal evidência um vídeo de pouco mais de 30 segundos. Segundo a queixa, as imagens mostram uma conversa de Rueda com Bivar ao telefone, por volta das 23h de 26 de fevereiro. No breve trecho anexado ao processo, uma voz, que seria de Bivar, diz a Rueda que “acabaria” com o parente dele. O vídeo não mostra o contexto da conversa.

Na queixa à polícia, Rueda disse ainda que Bivar falou com ele naquela noite por meio do telefone do deputado federal Marcelo Freitas, do União Brasil de Minas Gerais, que intermediou o contato. Na sequência do vídeo, gravado pela mulher de Rueda, Florinda, o vice-presidente do União Brasil disse ao deputado que esse era o motivo pelo qual vinha evitando falar com Bivar. Rueda afirmou então a Freitas que, diante da ameaça, procuraria a Polícia Federal no dia seguinte.

“Marcelo, deixa eu te falar. Cara, tu tá vendo por que eu não queria falar? Eu vou para a Polícia Federal amanhã, vai ser um caco de c*. Ameaçar (…), que vai atrás (…)? Marcelo, fica aí, tu conseguiu tudo que tu queria, irmão. Eu evitei falar com Luciano para evitar isso, tá entendendo? Meu irmão, tu presta atenção onde tu se meteu, Marcelo, porque eu disse a tu desde o começo…”, disse Rueda, até o vídeo ser interrompido.

Marcelo Freitas não aparece na gravação dizendo mais do que breves palavras, interrompidas por Rueda. O deputado foi arrolado como testemunha pelos advogados de Rueda, assim como o deputado federal Carlos Busato, do União do Rio Grande do Sul, que também estaria com Bivar no momento da suposta ameaça.

Em entrevista coletiva na terça-feira, Bivar rechaçou as acusações. “Repudio qualquer ilação contra os acontecimentos. Isso é fruto contra as represálias de denúncias que estamos apresentando hoje ao Conselho de Ética do partido”, afirmou. “Essa minha indignação de querer imputar a nós um assunto particular que não tem nada a ver com um assunto político-partidário”, emendou.

No entanto, Bivar admitiu ter ameaçado Rueda, mas alegou ter feito isso após primeiro ter a família ameaçada pelo rival. “Eu sei que ele ameaçou a minha família e em represália eu também ameacei e disse que vou acabar com a raça política dele”, ponderou Bivar.

Questionado se estava reconhecendo a ameaça a Rueda, Bivar respondeu: “Entenda como quiser. Se ele me chamou de feio, eu falei que ele é horrível.”

Por fim, ele acusou a esposa de Antônio de Rueda de tentar abrir o cofre dele em um apartamento em Miami. Disse que o equipamento guardava libra e dólar, mas não informou o valor. Contou que costumava emprestar o imóvel para o casal, do qual era amigo, e que reportou a Antônio de Rueda sobre o sumiço do dinheiro.

Questionado por um repórter de quem era o apartamento, Bivar afirmou ser seu. Questionado novamente porque o imóvel não aparecia em sua declaração de patrimônio ao TSE, titubeou e mudou a informação. Falou que ele pertence à empresa norte-americana da qual tem ações, mas se recusou a falar o nome da firma.

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