Presente no imaginário brasileiro, o rebolado já virou sinônimo de desenvoltura em ditados populares, foi tematizado em incontáveis músicas e virou um produto de exportação especialmente valorizado em videoclipes. Para ficar em alguns exemplos marcantes, esse movimento circular já ganhou contornos de certa inocência juvenil com o hit “Vai Ter que Rebolar” (1995), de Sandy & Júnior, antes de virar febre nacional na coreografia bamboleante da “Dança do Bumbum” (1996), do grupo de pagode É o Tchan. Desde então, o ato nunca mais saiu de moda e foi ganhando mais sofisticação à medida que surgiram técnicas que adicionavam velocidade e forma ao rebolado – caso do “quadradinho de oito”, cuja criação a cantora Anitta reivindica para si.

Curiosamente, para além dessa recorrente presença na música, seja como tema ou como elemento coreográfico, o rebolado também vem despertando o interesse de cientistas, que, por sua vez, exaltam o potencial do movimento para a saúde. Foi o que evidenciou uma revisão literária publicada no ano passado, durante o Congresso Americano de Medicina de Reabilitação. O estudo em questão considerou 59 artigos que, somados, avaliaram um total de 2.144 adultos jovens, de meia-idade e idosos, dos quais 1.337 eram mulheres.

“Descobrimos que a força dos abdutores do quadril é um fator crítico para o equilíbrio e a função de mobilidade, independentemente da faixa etária considerada”, anotam os autores, indicando que a ativação neuromuscular dessa região aumenta o bem-estar em qualquer idade.

As descobertas dos cientistas não surpreendem a educadora física, dançarina e professora de dança Mirian Barreto, que já havia percebido tais benefícios do rebolado no dia a dia. “Rebolando, a gente destrava o quadril, e isso traz vários benefícios, tanto físicos quanto emocionais. Além disso, favorece a liberação de dopamina e serotonina, que causam sensação de relaxamento e prazer. O ato também favorece a melhora em quadros de ansiedade, humor e autoestima e (no contexto de aulas coletivas) ainda facilita o processo de socialização”, argumenta.

Mirian pontua que o hábito de rebolar promove a ativação dos músculos da região do quadril, como o glúteo máximo, médio e mínimo, o piriforme, entre outros, beneficiando as funções motoras de equilíbrio e mobilidade. Mas ela adverte que, sozinho, o movimento não resolve condições específicas relacionadas a essa região do corpo.

“Quando a gente fala de outros músculos, como os do assoalho pélvico, que precisam ser fortalecidos para tratar, por exemplo, casos de incontinência urinária, o que importa mais é o relaxamento e a contração dessa musculatura. Então, existem exercícios fisioterápicos que serão mais indicados que a dança”, assinala. Ela lembra que dores lombares e disfunções sexuais também exigem um tratamento específico, pois podem envolver outras questões, como hérnia de disco e útero retrovertido, definido por sua posição, que está em direção à coluna vertebral. “Mas, em linhas gerais, rebolar proporciona a ativação e o alongamento dos músculos da região do quadril, sendo uma atividade que pode, sim, ajudar no tratamento de algumas condições, desde que associada a outros exercícios”, situa.

Barreiras

Mesmo sabendo que rebolar faz bem para a saúde física e mental, muitas pessoas não se rendem ao movimento. No seu caso, como anda o seu rebolado? Em dia? Ou você é daquelas pessoas que têm vergonha ou preconceito de mexer o quadril? Se for o caso, saiba que você não está sozinho. Muitas pessoas sofrem com barreiras culturais, sociais e pessoais que as impedem de rebolar livremente.  

“Essas barreiras vêm de um passado opressor, em que as pessoas eram reprimidas por seus movimentos corporais, considerados vulgares ou inadequados”, argumenta a educadora física Mirian Barreto, acrescentando que esse histórico gerou travas no corpo e na mente, que afetam a autoestima, a autoconfiança e a expressão da sexualidade. “Nós fomos deseducados sobre o nosso próprio corpo. De certa forma, é como se o machismo e o racismo tivessem colonizado nossa mente e corpo. Mas, à medida que compreendemos isso, podemos nos libertar dessas amarras, e o rebolado, que pode até vir forçado no começo, vai se naturalizando com o tempo, à medida que nos reconhecemos nessa atividade”, assinala. 

Dicas   

Para quem deseja dar um primeiro passo no sentido de incorporar o rebolado à rotina diária, a primeira dica de Mirian Barreto é não se comparar com os outros, principalmente nas redes sociais. “Se você está começando, não tente se equiparar com quem já faz movimentos difíceis, como quadradinho de oito ou alcança a velocidade número cinco”, sugere.  

“O importante é você ter o seu rebolado, você aproveitar o movimento que está fazendo para explorar a sua própria capacidade. Para isso, você pode dançar na frente do espelho, ou de olhos fechados, colocar uma música que você gosta, pode fazer caras e bocas…”, prossegue. “E, claro, ter o acompanhamento de um profissional é sempre muito bom, pois ele pode te orientar sobre a técnica, a postura e a respiração. Mas o mais importante é você se entregar ao som, se explorar, se autoconhecer, ver o que seu corpo é capaz de fazer e até onde ele pode ir”, conclui a professora de dança.

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