A Câmara dos Deputados teve, na última quarta-feira (18), mais um dia em que os trabalhos “andaram de lado” em função de uma disputa política. Na sessão de votações (deliberativa virtual), os parlamentares aprovaram uma medida provisória que prorroga contratos de servidores do Incra, mas o PL da Cabotagem, projeto de interesse do governo, não foi analisado.

Parlamentares disseram ao R7 Planalto que nada que exija grande debate (ou seja, as matérias mais importantes) será votado até o segundo turno das Eleições. E depois disso, o Congresso terá apenas 20 dias antes do recesso, para votar matérias complexas, como o Orçamento de 2021. Há deputados que defendem que não haja recesso, mas não há consenso sobre isso.

A paralisação dos trabalhos já dura praticamente dois meses. Além das eleições municipais, que tradicionamente afastam os parlamentares de Brasília – eles se deslocam para os Estados para participar de campanhas de candidatos dos seus partidos -, uma disputa política trava os trabalhos.

De um lado, o centrão governista, a base de apoio do presidente Bolsonaro. De outro, o centro independente, os partidos que apoiam o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Antes próximos, mas afastados desde que Bolsonaro formou uma base com parte do grupo, os blocos informais travam agora uma batalha por espaço que refletirá em quem comandará a Câmara pelos próximos dois anos e, claro, nas eleições presidenciais de 2022.

O foco da disputa no momento é a presidência da CMO (Comissão Mista de Orçamento), que tem como missão a elaboração e aprovação do orçamento do País, crucial dado o enorme rombo nas contas e decisões importantes a tomar, como a expansão do Bolsa Família, um desejo de Bolsonaro. 

No início do ano, os partidos do centro formaram um bloco formal que possibilitaria que eles tivessem direito na escolha da presidência da CMO e houve um acordo para que o cargo fosse ocupado por Elmar Nascimento (DEM-BA), aliado de Rodrigo Maia. Em troca, o grupo de Maia apoiaria Arthur Lira (PP-PB) para a presidência da Câmara em 2021.

A comissão, no entanto, não foi instalada em função da pandemia e, nesse meio tempo, DEM e PSDB saíram do bloco formal após a aproximação dos outros partidos com o governo Bolsonaro. Com essa mudança no jogo de forças, o PP de Lira, nome de preferência do governo para assumir a presidência da Câmara, alega agora que tem a prerrogativa de indicar o presidente da CMO e quer a deputada Flávia Arruda (PP-DF) ocupando o posto.

Sem acordo, os centristas governistas começaram a fazer uma obstrução às votações, mesmo de projetos de interesse do próprio governo. O objetivo é pressionar Rodrigo Maia a ceder na CMO em troca da liberação da pauta. Maia tem interesse em votar o máximo de projetos na Câmara, já que deixa a presidência em 1º de fevereiro.

Além disso, a oposição está em obstrução desde o dia 6 de outubro porque defende que a MP 1000, que manteria o Auxílio Emergencial de R$ 600 até dezembro, seja analisada pelo Parlamento. Mas, por ser numericamente inferior, o bloco, sozinho, não seria capaz de paralisar totalmente os trabalhos.

Com o impasse, desde 22 de setembro nenhum projeto de lei é analisado ou aprovado pelo plenário. De lá para cá, as poucas sessões deliberativas aprovaram apenas medidas provisórias e vetos.

A paralisação nos trabalhos colocou um freio na atuação do Congresso, que vinha em 2020, diante de todas as dificuldades, aprovando medidas importantes no combate à pandemia, como a PEC do Orçamento de Guerra, que possibilitou que o governo injetasse dinheiro nas camadas mais vulneráveis (auxílio emergencial) e nas empresas, além de vários outros projetos.

Agora, a poucos dias do final do ano, as aprovações devem se restringir à LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias). Sem ela o governo entraria em “shutdown”, sem poder fazer nenhum pagamento. Também devem ser analisados PLPs (Projeto de Lei Complementar) 101 (dinheiro para Estados) e 137 (dinheiro de fundos para reduzir a dívida).

Esses dois projetos serviriam como um paliativo pela a não aprovação das PECs Emergencial, que colocaria gatilhos no teto de gastos e instituiria o Renda Cidadã, e a do Pacto Federativo, de redistribuição de recursos para Estados. Além disso, injetariam R$ 177 bilhões para reduzir o déficit 2020. Ou seja, o mínimo necessário para um país em uma situação fiscal extremamente delicada.

Isso até que o novo presidente da Câmara seja escolhido e as forças de poder sejam reacomodadas.

Com todo esse nó, as reformas consideradas prioritárias pelo governo Bolsonaro –administrativa, tributária, além das privatizações e regulamentações de setores – também não andam.

Em entrevista ao JR Entrevista, o deputado Elmar Nascimento citou alguns dos projetos parados: Marco Legal do Saneamento, Marco Legal de Rodovias, Lei do Gás (precisa ser votada no Senado para eventualmente voltar para a Câmara), além das reformas tributária e administrativa.

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