No dia em que milhares de cidadãos israelenses participaram de um protesto contra a reforma judicial defendida pelo primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, Tel Aviv sofreu, ontem, o primeiro atentado terrorista em pouco mais de um ano. Por volta das 21h (16h em Brasília), um homem disparou contra israelenses que escolheram o restaurante Goocha, na esquina da Rua Dizengoff com a Boulevard Ben Gurion, no coração da metrópole, para confraternizarem durante a primeira noite do fim de semana em Israel. O ataque deixou três feridos, um deles em estado crítico.

O atirador se escondeu atrás de um prédio e foi morto pela polícia. Segundo as autoridades israelenses, Mo’taz Khawaja tinha 23 anos e morava no vilarejo palestino de Ni’lin, perto de Ramallah, na Cisjordânia. O jornal The Jerusalem Post informou tratar-se de um integrante do movimento fundamentalista islâmico Hamas que esteve preso em Israel por duas vezes, acusado de portar armas ilegais.

O próprio Hamas reivindicou a autoria do atentado e classificou a ação como “uma resposta inicial aos crimes de ocupação”, de acordo com Abd Al-Latif Al-Kanua, porta-voz do grupo. O ataque coincide com uma visita de Lloyd Austin, secretário da Defesa dos Estados Unidos, ao país. Horas antes do tiroteio, o chefe do Pentágono expressou preocupação com a multiplicação de atos de violência cometidos por colonos judeus contra palestinos na Cisjordânia e advertiu que esses incidentes podem gerar mais insegurança.

Pânico

Dov Friedland, 27 anos, fazia mais uma entrega de fast-food em Tel Aviv quando foi surpreendido pelo tiroteio. “Eu estava a uns 200m do cruzamento da Dizengoff com a Ben Gurion quando escutei pelo menos seis disparos. Vi ambulâncias, em alta velocidade, na contramão. Senti que algo tinha acontecido. Parei minha bicicleta e entrei em pânico. Depois disso, rapidamente ouvi os tiros. Achei que pessoas tivessem morrido”, contou ao Correio, ainda no local do ataque.

De acordo com Dov, os estampidos que ele escutou ocorreram durante a operação da polícia para matar o extremista. Ao ser perguntado pela reportagem sobre como lida com o medo, o entregador relatou que escapou de outro atentado, em um bar também na Rua Dizengoff — em abril de 2022, outro atirador matou três israelenses e feriu 10. “Tenho estresse pós-traumático. Tento me manter forte e confiante de que essas coisas não ocorram, mas não estou otimista em relação a isso”, acrescentou. “Desde a independência de Israel, há quase oito décadas, temos sido alvos de atentados.”

Chai, funcionário de uma sorveteria situada a poucos metros do local do ataque relatou ao Correio que ouviu cinco tiros. “Pensava que fossem fogos de artifício ou algo assim. Vi muita gente descer a avenida correndo. Minha primeira reação foi fechar a porta. Foi quando vi o terrorista. Ele não falava nada e apenas segurava uma pistola. Como ele não me viu, eu e meus colegas nos protegemos no subsolo da loja. Depois, a polícia chegou e foi todo o caos.”

A reportagem chegou ao restaurante Goocha pouco mais de uma hora depois. A região estava tomada por viaturas da polícia, por curiosos e por manifestantes que gritavam “morte aos árabes”. Nas imediações do estabelecimento comercial, o clima era de aparente tranquilidade. Sempre que um ataque terrorista ocorre, os policiais procuram liberar rapidamente a área para transmitir a impressão de que a vida continua e que a população não se curvará ao medo.

O atentado de ontem é mais um capítulo no recrudescimento do conflito. Nos últimos dois meses, uma série de ataques a tiros e operações das Forças de Defesa de Israel deixaram mortos e elevaram a tensão na região. Em visita a Roma, Netnanyahu desejou rápida recuperação aos feridos e anunciou o fortalecimento do trabalho das forças de segurança contra extremistas “Tenho certeza de que esses incidentes não vão diminuir, pois isso faz parte do nosso trabalho para construir a nação”, declarou o premiê.

Um tiroteio em um centro religioso de Testemunhas de Jeová deixou pelo menos sete mortos e oito feridos, na noite de ontem, em Hamburgo, a segunda maior cidade da Alemanha. Nas declarações iniciais, a polícia disse não ter informações sobre a motivação do ataque, mas advertiu a população para um “perigo extremo” em Alsterdorf, bairro da zona norte.

Os disparos ocorreram às 21h locais (17h de Brasília), segundo a polícia, acrescentando que “um ou mais” atiradores executaram o atentado. Todas as ruas nas imediações do centro religioso, localizado no distrito de Grossborstel, foram interditadas. Autoridades determinaram que os moradores não saíssem de suas residências.

A polícia não deu informações precisas sobre as vítimas. Cogitava-se a possibilidade de o atirador estar entre os mortos ou escondido no prédio. O jornal Bild mencionou um “banho de sangue”.

A Alemanha já foi alvo de ataques jihadistas, em particular um atentado com um veículo que causou 12 mortos em dezembro de 2016, em Berlim, cuja autoria foi reivindicada pela Estado Islâmico (EI). O país continua sendo alvo dos grupos extremistas, em particular devido à sua participação na coalizão que enfrenta o EI no Iraque e na Síria, e também no Afeganistão após os atentados de 11 de setembro de 2001 nos EUA.

Desde 2013 e até o fim de 2021, o número de islamistas considerados perigosos na Alemanha se multiplicou por cinco. Atualmente, são 615, segundo o Ministério do Interior. Calcula-se que os salafistas são 11 mil, duas vezes mais que em 2013.

Após um alerta do FBI, as autoridades alemãs anunciaram em 8 de janeiro a detenção de dois iranianos que supostamente teriam a intenção de cometer um atentado químico de caráter “islamista” no país.

Depoimento

Chegamos ao Restaurante Meatos, na Avenida Weitzmann, a poucos metros da sede do Ministério da Defesa de Israel, por volta das 19h30 (14h30 em Brasília). Éramos 11 jornalistas em um jantar com o general Gerson Menandro Garcia de Freitas, embaixador do Brasil em Israel. Cerca de uma hora e meia depois, escutamos o barulho da sirene de uma ambulância, que surgiu em alta velocidade. O som de mais viaturas da polícia e de ambulâncias contrastava com um ambiente que transparecia uma pretensa calmaria.

Ninguém deixou o restaurante onde estávamos. Decidimos caminhar até o local do ataque terrorista, a apenas 2km dali. No trajeto, presenciamos um helicóptero e carros da polícia. Na Praça Yitzhak Rabin, local onde o ex-premiê de mesmo nome foi assassinado, o prédio da Prefeitura de Tel Aviv estava iluminado com azul e branco, as cores da bandeira de Israel. Deparei-me com jovens caminhando calmamente pela calçada, alguns deles fantasiados, uma tradição no feriado do Purim, uma festa judaica que comemora a salvação dos judeus do aniquilamento.

Na véspera do ataque, eu e colegas caminhamos pelo mesmo cruzamento da Dizengoff com a Ben Gurion. Israelenses passeavam com seus cães, casais conversavam na calçada e o clima era de paz, pelo menos desde abril de 2022. Até a noite seguinte. 

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